Consórcio Sindical é tema do quarto painel da Oficina de Organização do Ramo Financeiro
Encontro, promovido pela Fetrafi-RS e pelo SindBancários Porto Alegre, reuniu dirigentes e assessores jurídicos para discutir novos caminhos de organização diante da fragmentação do sistema financeiro.
Na tarde do segundo dia da Oficina de Organização no Ramo Financeiro (09/12), dirigentes e advogados sindicais debateram os desafios contemporâneos da representação dos trabalhadores do sistema financeiro, em um cenário de fragmentação produtiva, terceirização e formas de contratação alternativas. Os diretores do Sindicato dos Bancários de Pelotas e Região, Sérgio Seus, Fábio Corrêa, Rafael Silveira e Lucas Cunha estiveram presentes.
O quarto painel da atividade de formação teve como tema “Reforma Estatutária – Consórcio Sindical: caminhos para o fortalecimento da representação no ramo financeiro” e contou com exposições dos advogados Jefferson Oliveira, assessor jurídico da Contraf-CUT, e Milton Fagundes, assessor jurídico da Fetrafi-RS.
Negociação nacional e representatividade
Jefferson Oliveira iniciou o debate ressaltando que a categoria bancária é hoje a mais organizada do País justamente por ter construído uma negociação coletiva nacionalmente articulada, capaz de garantir instrumentos coletivos únicos e direitos iguais a bancários de todas as regiões do Brasil.
Essa conquista, segundo ele, é sustentada pelo “princípio da adequação setorial negociada”, um dos pilares do Direito do Trabalho brasileiro. O conceito estabelece que as normas definidas em acordos e convenções coletivas podem prevalecer sobre a legislação geral, desde que respeitados os limites constitucionais e assegurada a proteção aos direitos fundamentais dos trabalhadores.
Tecnologia, enxugamento e fraudes trabalhistas
O painel também apontou que o enxugamento da categoria bancária não decorre apenas do avanço tecnológico, mas do “uso estratégico dessas tecnologias pelos bancos” para reduzir quadros e esvaziar a proteção coletiva. Esse processo se dá por meio de práticas como “terceirizações artificiais”, que consistem na transferência de trabalhadores para empresas do próprio grupo econômico; e “pejotização”. “Todas com o objetivo de deixar esse trabalhadores de fora das convenções coletivas”, disse Oliveira.
Diante desse cenário, o advogado defendeu a superação do modelo tradicional de enquadramento sindical baseado exclusivamente na atividade preponderante da empresa, ressaltando que o critério central deve ser a atividade efetivamente exercida pelo trabalhador. Para o especialista, quem comercializa produtos financeiros, independentemente da forma jurídica da empresa, deve ser reconhecido como trabalhador do ramo financeiro.
Cooperativas de crédito e o debate no TST
O debate ganhou centralidade com o crescimento das cooperativas de crédito, que hoje reúnem mais de 120 mil trabalhadores e possuem capilaridade semelhante — ou até superior — à dos grandes bancos. O advogado da Contraf-CUT informou que a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST), construída a partir de uma realidade dos anos 1990 e 2000, foi reaberta após decisão unânime dos 27 ministros, que encaminharam o tema para um “Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR)”.
“A tese ainda será definida. O avanço mínimo esperado é o reconhecimento da equiparação para fins do artigo 224 da CLT, que trata da jornada especial de seis horas”, completou. O cenário ideal, segundo o advogado, seria a equiparação plena à condição de bancário. O julgamento deve ocorrer a partir de março e se estender por cerca de um ano.
Disputa política, lobby patronal e defesa da ampliação de direitos
O assessor jurídico da Contraf-CUT reconheceu que a demanda da categoria converge pontualmente com a Fenaban, que também defende o enquadramento dos trabalhadores do sistema financeiro, ainda que por razões patronais e voltadas à eliminação da concorrência. A divergência central, porém, está no conteúdo dos direitos: enquanto os bancos defendem “nivelar por baixo”, retirando a jornada diferenciada, o Movimento Sindical quer ampliar a todos os trabalhadores do ramo financeiro.
“O lobby das cooperativas será intenso e amplamente financiado, em razão do impacto econômico que o enquadramento teria, especialmente pelo passivo da sétima e oitava horas e pela submissão à negociação coletiva”, alertou Oliveira. Diante disso, a força do Movimento Sindical não estará no dinheiro, mas na unidade política, na legitimidade da representação e na defesa firme da ampliação de direitos.
Consórcio sindical como alternativa viável
Diante das dificuldades de obter um entendimento judicial estável sobre representação sindical, especialmente em um contexto de fechamento de agências e reorganização territorial dos bancos, foi apresentada a formação de consórcios entre sindicatos como alternativa viável.
A proposta parte do reconhecimento de que o consórcio pode garantir maior segurança jurídica e política, preservando direitos e estabilidade dos trabalhadores. O modelo permitiria ampla autonomia organizativa às entidades, sem perda de independência, desde que haja um “instrumento negociado com a Fenaban” que obrigue os bancos a reconhecerem formalmente o consórcio.
Entre os critérios essenciais está o reconhecimento da base territorial dos sindicatos consorciados como uma base única, garantindo, por exemplo, a estabilidade de trabalhadores em municípios onde determinado banco não possui mais agência física.
Instrumento de transição e ampliação da representação
Em sua exposição, o assessor jurídico da Fetrafi-RS, Milton Fagundes, destacou que o consórcio sindical não é uma fusão nem incorporação, mas um “instrumento de transição”, que permite atuação integrada sem perda de registros, autonomia ou garantias legais. “O consórcio é pensado como um guarda-chuva do ramo financeiro, capaz de integrar sindicatos bancários, de cooperativas de crédito, correspondentes bancários, lotéricas, prestadores de serviços e outros segmentos hoje desorganizados ou mal enquadrados”, explicou Fagundes.
Experiências em curso, como sindicatos regionais de cooperativas de crédito em Santa Catarina, foram citadas como exemplos de uso estratégico do próprio princípio da especificidade a favor da organização sindical.
Método, governança e segurança jurídica
O debate também recuperou aprendizados de experiências anteriores. Um dos principais erros do passado, segundo Fagundes, foi a constituição de consórcios formados por pessoas físicas, o que fragilizou a governança. Segundo ele, a alternativa considerada mais consistente é o consórcio de pessoas jurídicas, reunindo sindicatos formalmente organizados.
De acordo com o advogado, do ponto de vista jurídico, o consórcio se estrutura como uma associação civil, com estatuto próprio, governança definida e registro formal. Ele ressaltou a importância de um período prévio de aproximação política entre as entidades, baseado em diálogo e confiança, antes da formalização.
A questão do patrimônio também exige cautela, alertou Milton Fagundes. “A incorporação inicial de bens deve ser mínima, sobretudo por razões jurídicas e tributárias, enquanto a destinação gradual de receitas ao consórcio é vista como um indicativo positivo de integração real”, orientou.
Redefinir a categoria e investir em trabalho de base
Outro eixo central do painel foi a necessidade de redefinir o conceito de categoria bancária. Para o assessor da Fetrafi-RS, a identidade histórica da categoria vem sendo esvaziada, à medida que o trabalho bancário migra para cooperativas, empresas de tecnologia, prestadores de serviço e estruturas pejotizadas. “O desafio é político, e não jurídico”, ressaltou.
Fagundes apontou que será necessário definir prioridades, investir em trabalho de base ativo, escalar dirigentes para novos territórios e construir pautas específicas para segmentos hoje sem representação efetiva, resgatando práticas de organização que marcaram o sindicalismo nos anos 1980.
Estratégia combinada e construção coletiva
Nas considerações finais, Jefferson Oliveira destacou que a estratégia em relação aos empregados das cooperativas de crédito precisa ser simultânea e combinada: disputa jurídica, mobilização política e reorganização sindical. “Não há modelo pronto, e cada região deverá construir o caminho mais adequado à sua realidade”, defendeu.
Milton Fagundes ressaltou que o Rio Grande do Sul precisa construir uma estratégia própria, debatida nas instâncias deliberativas da Federação, com definição clara de caminhos, prazos e prioridades. “O próximo passo apontado é levar o debate às regionais e aos sindicatos, promovendo amadurecimento nas bases”, sugeriu.
Ao final do debate ficou claro que o consórcio sindical não é a solução definitiva, mas “representa o caminho possível no atual momento histórico para enfrentar a fragmentação do sistema financeiro, ampliar a representação e criar condições para avanços futuros na negociação coletiva”.


Texto: Assessoria de Comunicação da Fetrafi-RS
Fotos: Assessoria de Comunicação do SindBancários Porto Alegre
Edição: SEEBPelotas

